Apresentação
Um poema que surgiu na urgência de existir além do corpo.
eu não sou mais capaz de jantar no fluxo da maré
a realidade atroz engole meu corpo infrequente
o meu tamanho insignifica e mutila as percepções
os meus medos inebriam a razão da causa
a memória não convence mais nada
as sombras que inventei não chegam ao topo da montanha
os olhos aguados diluem-se a beira-mar
na imprecisão das horas e dos dias
na catástrofe monumental que se ergue a cada passo
há células se deteriorando que procuram por mim
na vaga escuridão da incógnita que mora nos confins da carne
atrás da unha gasta, roída, maldita
meu corpo vaga no vácuo do planeta
boiando entre estrelas que formam ondas assimétricas
dissolvido na indiferença e consumido pela ira
esqueci as vontades, as inconsequências, a fluidez do tempo
escorraçados, maltrapilhos
nas valetas das esquinas de mim
nunca mais senti as ruas, as peças, a dança
não andei na avenida, nas pontes, portões, perfumaria
clamo por ambiguidade e ramificação
declamo as fonologias como quem clama por gravidade
habitando no giro circunstancial do planeta
desafeto imparcial
o amor é um punhal pesado, metal que corta
queima e rasga os tecidos cruelmente até arder
e arde, submerge, naufraga, aflige, prende, sucumbi
esfrega a areia em meus olhos hostis
que não enxergam mais as possibilidades infames
queima minha cozinha na hora do jantar
envelhece os buracos do tempo envolta do meu corpo
come as paixões com sal e pimenta
desafia o pecado no rito dos destemperos
veste a camisa azul-marinho enquanto desabotoa as verdades
desumaniza os meus estímulos naturais
enquanto o timbre desencarna no litoral azulejado
ensanguenta-se a encruzilhada do poema
no plástico, no espaço, no vazio bifurcado
a fissura é incorrigível aos gritos mutados
Informações
Este texto é original e foi publicado primeiramente no litera mondru.
Poema original, escrito em algum dia caótico de 2024.


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