Apresentação

Inauguro aqui, com este texto, uma pequena série semanal, quinzenal, mensal, quiçá diária ou algo que o valha e substitua, que irá de alguma maneira trazer você, querido e paciente leitor a experimentar sensações às quais nunca (ou quase nunca) procuramos sentir.

São situações das mais variadas do cotidiano, mesmo que improváveis. Por aqui, trarei você, segurando pela mão, se assim me permite para uma grande viagem dentro e fora de si próprio.

Ah, sem antes me esquecer de alertá-lo: embora poéticos e improváveis, estes textos, desta pequena série, são crônicas. Aproveite o passeio.


Círculo

Imagine um quadro. Imagine também que está dentro dele: a moldura preta, trabalhada em arabescos, talhados em madeira de lei. O conteúdo do quadro são campos floridos, uma cabana sombria ao fundo. É noite .
Há uma estrada, cheia de postes de madeira, toda de terra e sem um fim que possa ser visto. Uma carroça passa tranquilamente. Alguns postes estão apagados.
Você está sentando em cima da cabana, o luar ao fundo testemunha tudo. Muitas árvores, um pequeno rio e você lá, apenas sentado. Dentro do quadro você pode ouvir corujas, talvez alguns outros animais, mas o que mais se pode ouvir de maneira ensurdecedora é o silêncio. Ele se apossa de todo o quadro, feito uma erva daninha. Está desde a moldura até o fim invisível da estrada de terra.
O dia é um qualquer. Na chaminé da cabana, sobe uma fumaça infinita, com cheiro de sopa.
Imagine o interior da cabana, pois você não pode ver: uma ou duas cadeiras, uma lareira, uma mesa e alguns retratos na parede, uma cama com colchão de palha. A cabana não tem divisão de cômodos. Tudo é um só universo.
Em cima da mesa uma garrafa de vinho e alguns queijos.
Imagine quem está na cabana. Imagine que seja uma velha e enrugada senhora, vestida de maneira simples e atos comedidos e quase rituais. O que ela estaria pensando? Ela estava imaginando um quadro. Ela estava imaginando que estava dentro de um quadro, com a moldura preta, toda trabalhada em arabescos, talhados em madeira de lei. Era noite, cheiro de sopa.


Informações

Este texto é original e foi publicado primeiramente no litera mondru.

Material inédito publicado no Litera Mondru.

    Você gosta dos artigos de Thiago Douto? Siga-nos nas redes sociais!
    Comentários para: Círculo

    Login

    plugins premium WordPress